O valor do conhecimento
Quando Paulo chama a sabedoria do mundo de loucura diante de Deus (1Co 3:19), e quando ele em outro lugar nos adverte contra a filosofia (Cl 2:8), ele tem em mente a falsa e inútil suposta sabedoria que não reconhece a sabedoria de Deus em sua revelação geral e em sua revelação especial (1Co 1:21) e que se tornou nula em seus próprios raciocínios (Rm 1:21).
Mas no restante, Paulo e as Sagradas Escrituras, em sua totalidade, colocam o conhecimento e a sabedoria em um plano de grande importância. E não poderia ser de outra forma, pois a Bíblia afirma que Deus é sábio, que Ele tem conhecimento perfeito de Si mesmo e de todas as coisas, que pela Sua sabedoria Ele estabeleceu o mundo, que Ele manifesta Sua multiforme sabedoria à Igreja, que em Cristo estão escondidos todos os tesouros da sabedoria e do conhecimento, e que o Espírito é o Espírito da sabedoria e do conhecimento, que perscruta até mesmo as profundezas de Deus (Pv 3:19; Rm 11:33; 1Co 2:10; Ef 3:10; Cl 2:3). Um livro do qual procedem mensagens como essas não pode subestimar o conhecimento nem pode desprezar a filosofia. Pelo contrário, nele aprendemos que a sabedoria é mais preciosa do que as pérolas, e tudo o que podemos desejar não pode ser comparado a ela (Pv 3:15); ela é um dom daquele que é o Deus do conhecimento (Pv 2:16; 1Sm 2:3).
O que a Escritura exige é um conhecimento cuja origem seja o temor do Senhor (Pv 1:7). Quando essa conexão com o temor do Senhor é rompida, o nome de conhecimento é mantido, embora sob falsas pretensões, mas ele vai se degenerando gradualmente até se transformar em uma sabedoria mundana, que é loucura diante de Deus. Qualquer ciência, filosofia ou conhecimento que pense poder se manter sobre suas próprias pressuposições e que pode tirar Deus de consideração, transforma-se em seu próprio oposto, e qualquer pessoa que construa suas expectativas sobre isso ficará desiludida.
Isso é fácil de ser entendido. Em primeiro lugar, a ciência e a filosofia sempre possuem um caráter especial e podem tornar-se acessíveis a poucas pessoas. Essas pessoas privilegiadas, que podem dedicar toda a sua vida à disciplina do aprendizado, podem conhecer apenas uma pequena parte do todo, permanecendo, assim, estranhos ao restante. Qualquer que seja a satisfação que o conhecimento possa dar, todavia, ele nunca poderá, devido ao seu caráter especial e limitado, satisfazer as necessidades profundas que foram plantadas na natureza humana na criação, e que estão presentes em todas as pessoas.
Em segundo lugar, a filosofia, que depois de um período de decadência entra em período de fortalecimento, sempre cria uma expectativa extraordinária e exagerada. Nessas épocas ela vive a esperança de que através de uma séria investigação ela resolverá o enigma do mundo. Mas sempre depois dessa fervente expectativa chega a velha desilusão. Em vez de diminuir, os problemas aumentam com os estudos. O que parece estar resolvido vem a ser um novo mistério, e o fim de todo o conhecimento é então novamente a triste e às vezes desesperadora confissão de que o homem caminha sobre a terra em meio a enigmas, e que a vida e o destino são um mistério.
Em terceiro lugar, é bom lembrar que tanto a filosofia quanto a ciência, mesmo que pudessem chegar muito mais longe do que chegam agora, ainda assim não poderiam satisfazer o coração do homem, pois o conhecimento sem a virtude, sem a base moral, torna-se um instrumento nas mãos do pecado para conceber e executar grandes males, e assim a cabeça que está cheia de conhecimento passa a trabalhar para um coração depravado. Neste sentido o apóstolo escreve: Ainda que eu tenha o dom de profetizar e conheça todos os mistérios e toda a ciência; e ainda que eu tenha tamanha fé a ponto de transportar montes, se não tiver amor, nada serei (1Co 13:2).
Hermann Bavinck
In: Teologia Sistemática
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